Tríptico Assimétrico
“…E
nas margens do céu
eu sentei-me
E…”
– “Vamos…
Vamos olhar o céu!
…
… Do Mar, em mim, ainda não se acusam
saudades.
… Mas ainda bem me recordo… – recordo
o seu Azul e os seus Verdes… (tão Sonoros que eram)… Ainda bem me
lembro… (lembram-se os meus ouvidos… – estes sim: capazes de se recordarem
daqueles Verdes… e daquele Azul… ”
Er'à verdade: Eurico – o Frei (Frei Eurico, como os mais íntimos o tratavam) ainda bem se lembrava…
Mas por outro lado, os olhos de Eurico talvez padecessem em particulares
momentos da incapacidade de reterem em memória o som das estrelas… e o som do
negro e do azul do firmamento…
(As estrelas fixam-se a uma tremenda distância… a uma distância incalculável…
e o firmamento Eurico procurava-o e encontrava-o sempre num lugar incerto…)
...
… É mágica e misteriosa a arte que existe nessa lonjura imensa
(indizível) do firmamento. Mas por intermédio
dela (dessa arte), coexistem a distância e um permanente êxtase de silêncio… E
todos os sinais que em intermitência Eurico sentia, talvez viessem desse além com o fim de o despertarem... E tais sinais pronunciavam-se numa silenciosa e subtil linguagem.
…
Mas algures – bem o sabia Eurico – também existe um eremitério em chão macio e plano… e nele
(nesse eremitério) não há sombras… Ou algo a que se poderia chamar sombras simplesmente
seriam espaços onde a luz menos tocasse.
Nos corredores, nos recantos, e em esconsos desse eremitério, o tempo produz correntes levemente
perceptíveis, assemelhando-se essas correntes a brisas em delicados movimentos,
como que num fino e interminável tricot…
– brisas que entram por janelas escancaradas ou entreabertas (e mesmo que
fechadas se encontrem) e tudo percorrem e penetram…
No eremitério, o tempo
é alimentado ao peito e vai pulando
de regaço materno em regaço materno.
No eremitério não
existe escuridão. Ilumina-o eternamente candelabros, lanternas, candeias,
tochas, archotes… lustres cintilantes.
…
À epiderme do corpo
que a Eurico permite as astrais experiências,
não escapa a coada luz dos seus vitrais interiores – estes tão coloridos quanto
a alegria que vivifica cada uma das suas víscera.
À revelia do labor do pensamento (do pensamento missionário e obreiro
de Eurico), a um ritmo abstracto vão-se erguendo por vezes muralhas de linho,
onde, no grão fino do seu alçado que pende e ondula, os pigmentos das enigmáticas
imagens se vão esbatendo.
No eremitério procuram-se
clarabóias onde não é possível encontrar-se céu; procuram-se imagens em caixilhos
onde não se encontram nem janelas nem varandins…
…
No eremitério, os
rumores, os murmúrios e os zumbidos, são melodias e cantares num sereno coro… E
estas melodias e cantares num sereno coro serão talvez as cores do mar que a
qualquer distância, e de qualquer ângulo de visão, Eurico é capaz de ouvir de
memória (bem se lembra Eurico das cores do Mar).
Do Mar Eurico ainda se recorda… (Eurico está convencido de que as seus ouvidos são búzios).
– “… E o Céu?... E as
estrelas?... Onde está ele, o Céu… e onde estão elas, as estrelas?... Será que
ainda nos lugares de sempre?...”
E Eurico eleva os olhos tendo a sensação que o seu corpo cresce acompanhando
o seu olhar.
…
Como que numa redoma transparente (cristalina), e protegida por firmes paredes , vive
uma lenda que fala do suspiro de um
dedo que aponta rompendo um misterioso oculto…
Tal como o ponteiro de uma bússola ao tocar
ao longe todos os horizontes… Ou como a vara de um druida que penetra as
cortinas do tempo…
…
Há um mirar ao longe… – olhares velozes empurrados pelo eflúvio
da curiosidade e da dúvida… seguindo um dedo que aponta tal como o ponteiro da
bússola… Ou como a vara do druida penetra as cortinas do tempo…
…
(Eurico ainda olha para o alto, enquanto recorda o azul e os
verdes do Mar).
Texto:
M. Gama Duarte
12 de Outubro de 2011
12 de Outubro de 2011
Fotografia:
M. Gama Duarte
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