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sexta-feira, 16 de janeiro de 2015




Pintura
Sem título
Temática: A janela e a cruz
Materiais: Aguarela, pastel, lápis de cor e tinta-da-china.
Suporte: Papel  





Lauro Telmo
e a sua ecologia do silêncio

(Crónica)




– “O homem, a tela… o silêncio.
… Sim: o homem… a tela… Mas também o silêncio…
(triangular combinação enigmática e alquímica)
E em cada vértice seu elemento… E cada elemento em seu vértice afirmando-se em excelência”…
 Falava assim (ou dizia) Lauro Telmo que, naquele instante, em frente de um dos cavaletes que tinha sempre a postos, dialogava com os seus botões no sossego do atelier onde pintava – atelier que se situava nas águas-furtadas de um velho prédio do antigo bairro da sua cidade natal.        
Mas um outro elemento avizinhava-se de visita (Lauro Telmo sentia-o – reconhecia-o). E assim, a esses três elementos já presentes, juntava-se um quarto elemento: a Ideia, ou a inspiração; a graça, ou o mistério… (uma ou outra coisa… – ou qualquer que ela seja – numa quase perfeita simbiose).
Mas, qualquer que seja o sentir no momento, o quarto elemento precede o acto criativo no concreto, e confere ao acto uma espécie de (ou um particular) sentido ecológico

E assim decorre o processo: um dos três vértices do triângulo imaginário abre-se (dissipa-se)… E Lauro Telmo assiste à prodigiosa transformação daquela angular geometria. Gere-se uma nova amplitude: agora quatro vértices em vez de três... Agora os quatro elementos em plena assunção… – uma combinação entre sublimes afinidades, e em solenidade e excelência.
 “Agora o homem, a tela, o silêncio… e a inspiração (ou a ideia… ou a graça, ou o mistério…)” – assim pensou, e é natural que Lauro Telmo assim pensasse.

Chegado o momento, Lauro Telmo pode imaginar, por antecipação, a obra concluída… – imaginá-la, enquanto realidade, de constituição densa por efeito de sucessivas aplicações de camadas de óleo, de acrílico, ou de outra qualquer matéria manuseável e que possua razoável plasticidade, textura e intensidade de cor.
Por outro lado, se for o caso de ser usada, no acto da execução (ou materialização da obra), uma técnica mais leve que produza alguns e certos efeitos minimalistas, a tela apresentar-se-á com consideráveis espaços privados de tinta, sem que essas aberturas, ou ausências de matéria plástica, diminuam o valor final da obra. Pois, em contraste, ou em alternância com os espaços em branco, pode ser riquíssimo o jogo harmónico e o equilíbrio cromático e estético, produzido pelas pinceladas escassas e soltas (escassas e soltas, mas precisas). E mesmo os espaços em branco de que se fala, participam vigorosamente e com forte presença em tal composição… E a obra final apresentar-se-á com uma surpreendente coerência… – uma coerência que impera acima de qualquer rubor de conflitualidade entre cores, planos, zonas do suporte que se mostrem em branco (ou de reserva), contrastes, formas… etc.
E, concluída que esteja a obra, Lauro Telmo pode aprecia-la, analisá-la, divagar ou dissertar, dispersar-se em considerações em que terá presente conceitos sobre o sentido do abstracto, a aplicação de técnicas variadas, a estética, as possíveis leituras no plano e domínio do subjectivo ou do filosófico… (e outras possíveis considerações). 


A relação de Lauro Telmo com a arte era uma espécie de laboratório onde ensaiava emoções, experimentava físicas sensações, onde redescobria as virtualidades e prazeres dos seus sentidos e variantes da sua sensibilidade. E era também uma oportunidade de estudo das probabilidades da inexistência de limites quando se viaja em liberdade no espaço/tempo consagrado a toda a arte que o divino entende abençoar.
Lauro Telmo tirara a claro uma conclusão (ou acreditava que o havia conseguido):
A leitura simples e essencial das coisas não reduz a percepção e o reconhecimento da beleza, da originalidade, da consistência estrutural e da força vital e comunicativa do objecto ou da obra artística… Ele passara a ver o simples e o essencial aliados numa imperiosa disciplina de economia que um particular e específico sentido de ecologia acolhia. E em tudo, ao cabo e ao fim, expressa-se na atitude ecologista a forma de economia mais pura e natural.

Nos tempos em que Lauro Telmo ainda era criança, quando alguém dele se aproximava e lhe perguntava o que queria vir a ser quando chegasse a adulto, ele tinha sempre a resposta à saída da boca (que vinha do seu íntimo): “Quero ser pintor!”

Lauro Telmo teve uma infância feliz. Conserva generosas recordações desses recuados tempos… – memórias das fabulosas brincadeiras ao “faz de conta” com que se entretinha… – brincadeiras que têm subtis raízes que se alimentam da mais pura e singela inocência, fantasia, imaginação… e que se alimentam ao mesmo tempo de uma cristalina percepção da essência do real.
Uma das mais vivas memórias da sua infância é a memória de um mágico silêncio em que muitas vezes submergia…

Lauro Telmo, através da observação da arte mímica de Marcel Marceau, havia extraído a prova de que tudo pode ser compreendido no seio do silêncio, e à sua transparência… – o que equivale a dizer que o silêncio proporciona ao ser humano uma ímpar oportunidade de percepcionar e compreender o que existe de profundamente mais real no milagroso processo através do qual se desperta para a beleza e para a natureza divina de cada ser, criatura, ou coisa.
Oferece-se por ventura neste processo que atrai, não raramente, as substâncias dos sonhos, uma realidade material menos palpável mas, sem dúvida, fabulosa e extraordinariamente expressividade.     

Lauro Telmo ficava fascinado todas as vezes que via pela TV os espectáculos de mímica de Marcel Marceau.
Lauro Telmo bem se recorda daquele dia em que a mãe, com um especial brilho, vivacidade e ternura no olhar, serenamente lhe dissera: “Sabes, meu filho?... Entre as mãos e o coração de Marcel Marceau, tanto cabe a pequena andorinha que se perde no azul do céu de um imenso deserto, como cabe um enorme astro (um planeta por exemplo) que descreve a sua trajectória na distante galáxia da qual é filho e à qual pertence”.
– “O quê, mãe?” – quis Lauro Telmo entender... – perceber o que a mãe lhe havia dito daquela maneira (com aquelas palavras) que o deixou deveras curioso, mas ao mesmo tempo confuso. Mas de seguida a mãe explicou-lhe tudo de uma maneira mais simples, e Lauro Telmo então compreendeu.                  
       
              

                                                                                                M. Gama Duarte

                                                                                             05 de Janeiro de 2009


Pintura
Sem título
Temática: A janela e a cruz
Materiais: Aguarela, pastel, lápis de cor e tinta-da-china.
Suporte: Papel  

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